Apesar de medidas afetarem projeto atômico iraniano, não devem persuadir Teerã a negociar, dizem especialistas
Leda Balbino, iG São Paulo
Assim que o Conselho de Segurança da ONU aprovou a quarta rodada de sanções contra seu programa nuclear, o Irã apressou-se em manter o tom de desafio contra o Ocidente. O governo iraniano reafirmou sua determinação em continuar com o enriquecimento de urânio e o presidente Mahmoud Ahmadinejad subestimou a medida, afirmando que ela deve "ser jogada no lixo" e é “um papel sem valor”. No entanto, especialistas entrevistados pelo iG indicam que, até agora, as sanções foram eficientes em evitar que a República Islâmica se tornasse a próxima potência nuclear do mundo.
Foto: AFP
Presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, cumprimenta convidados ao chegar a cerimônia do "Dia do Irã" na World Expo, em Xangai, China (11/06/2010)
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O acadêmico Ali Alfoneh, do American Enterprise Institute, um centro de pesquisa em Washington, lembra que os EUA conseguiram desenvolver duas armas atômicas em 1945, poucos anos depois do início de seu programa nuclear. “Por outro lado, o Irã começou a desenvolver seu projeto atômico no final dos anos 1960, utilizou avançada tecnologia e experiências de outros programas de pesquisa nuclear, mas não se tornou uma potência atômica, em um sinal de que o regime de sanções tem funcionado", afirmou Alfoneh ao iG.
Para o especialista, uma das provas de que o regime teme sim as sanções foi a assinatura, em 17 de maio, do acordo de troca de combustível nuclear com Brasil e Turquia. “A tentativa de última hora do Irã de evitar o isolamento internacional demonstrou que são mentirosas suas alegações de que as sanções não afetam negativamente seu programa atômico”, disse.
O professor Muhammad Sahimi, da Universidade da Carolina do Sul, concorda com o raciocínio de Alfoneh e lembra que, além das sanções aprovadas pelo Conselho de Segurança da ONU, o Irã também é alvo de punições extraoficiais de muitos países europeus. “Por exemplo, os bancos e instituições financeiras desses países não abrem linhas de crédito para as companhias iranianas que querem importar produtos da Europa. Elas têm de pagar em dinheiro”, afirmou. “Como resultado, os preços de todos os produtos no país subiram recentemente”, completou.
Além dos países europeus, os EUA também impõem sanções unilaterais, fora do âmbito da ONU, afirmou Alfoneh. “Medidas impostas, por exemplo, no campo de petróleo e gás negaram à República Islâmica tecnologia para desenvolver ainda mais seu setor petrolífero, o que aumentou o custo das ambições nucleares do país”, disse o acadêmico do American Enterprise Institute.
Guarda Revolucionária
As sanções aprovadas na quarta-feira se seguiram a punições adotadas contra o país por três anos consecutivos desde 2006 sob a suspeita de que Teerã quer desenvolver armas nucleares. O Irã nega, afirmando que tenta somente produzir energia para fins civis.
Segundo Alfoneh, as novas medidas têm como alvo a máquina por trás do programa nuclear do Irã: a Guarda Revolucionária, apontada como eminência parda do regime e responsável pela repressão contra os protestos que no ano passado contestaram a reeleição de Mahmoud Ahmadinejad.
Criada há 30 anos para proteger a República Islâmica, a Guarda atualmente é um amplo conglomerado militar que controla as baterias de mísseis iranianos, o programa nuclear e um império de negócios multibilionários que atinge todos os setores econômicos. Desde a primeira eleição de Ahmadinejad, em 2005, as companhias afiliadas à Guarda receberam 750 contratos governamentais em projetos de construção civil, de petróleo e gás.
Foto: Reuters
Conselho de Segurança da ONU se reuniu na quarta-feira para aprovar novas sanções
“Ao atacar os interesses econômicos dessa corporação, a comunidade internacional não apenas prejudica a economia iraniana em geral, como aumenta o custo do programa nuclear para a instituição que o promove de forma mais agressiva”, afirmou Alfoneh.
Segundo Rasool Nafisi, acadêmico da Universidade Strayer, na Virgínia, a quarta rodada de sançõestambém permite a inspeção e a apreensão de carga dirigida ao Irã e enviada pelo país. “Isso certamente criará problemas para o envio de material para o grupo xiita libanês Hezbollah, para o movimento radical islâmico palestino Hamas e para que o Irã receba tecnologia militar da Coreia do Norte e de outros países”, disse.
Além dos reveses econômicos, o analista Alex Vatanka, do Jane’s Information Group e Middle East Institute, aponta que as sanções contra o Irã também têm um custo político, com o país sendo rotulado como “pária” na comunidade internacional e fracassando em evitar seu isolamento. “O fato de Uganda e Bósnia votarem a favor das novas punições, e de o Líbano só se abster, deve ter frustrado Teerã”, afirmou, referindo-se ao fato de que apenas Brasil e Turquia foram contrários às sanções entre os 15 países do Conselho de Segurança da ONU.
Mas Nafisi acredita que as sanções, por mais duras que sejam, não persuadirão Teerã a desistir de seu programa nuclear. “Eles investiram muito nesse projeto. Ele é a única coisa que as autoridades iranianas podem mostrar como uma conquista e uma posição de força contra o Ocidente”, afirmou o professor da Universidade Strayer.
Mesmo que eventualmente as medidas aumentem seus efeitos sobre a economia do país e, consequentemente, sobre a população, o especialista duvida que o país aceitará negociar seu programa como reivindicado pelo Ocidente. “Ditaduras como a República Islâmica prestam pouca atenção para o descontentamento popular”, disse Nafisi. “Elas apenas tentam alimentar seu limitado número de partidários e suas forças de segurança, exatamente o que o Irã vem fazendo”, completou.
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