Samuel Câmara
Pastor da Assembleia de Deus em Belém
Geralmente
fala-se com muita ênfase sobre a libertação que a fé produz, mas pouca
atenção é dada ao aprisionamento que a fé pode causar. Depende do tipo
de fé, obviamente. Ao meditar, pois, sobre a doutrina da fé, em como
está sendo ensinada e recebida entre os cristãos por toda parte,
preocupa-me o fato de que o moderno conceito de fé atualmente
apresentado por alguns pregadores está distante do significado que a
Bíblia apresenta.
Refiro-me
ao conceito atualmente em voga, que pode ser denominado de “fé-na-fé”,
ou seja, fé em coisas e pessoas; fé em métodos, no que podemos fazer,
não uma genuína e legítima fé em Deus baseada na Palavra de Deus.
A
minha preocupação se confirma pelos resultados que podem ser vistos nas
vidas de muitas pessoas que se esforçaram sinceramente em manter uma
vida de fé. Vejo, com pesar, muitas pessoas frustradas e machucadas,
sentindo-se infelizes porque a sua fé não funcionou. Vejo não poucos
espiritualmente esgotados, cansados da própria fé, com medo de confiar
em Deus.
Como
resultado, pesa-lhes ainda a autoacusação contínua de que não creram
como deveriam, ou que apenas têm pouca fé. Isso as esmaga mais ainda,
pois ficam a pensar que Deus as ama menos por causa do seu fracasso em
crer. Outros há que elegem Deus como um grande vilão a exigir de pobres
mortais o que não pode ser alcançado, a não ser pelos dotados de
espíritos superiores.
Penso
que nesse ponto reside a diferença entre a verdadeira vida de fé e a
vida meramente religiosa. Religião e fé não são palavras sinônimas, e a
prática de uma é a negação da outra. Religião é quando tentamos chegar a
Deus pelos nossos próprios esforços; a vida de fé é Deus chegando até
nós na revelação de Seu Filho Jesus Cristo.
Quando
as pessoas são instruídas a confiar em coisas e métodos, elas estão
sendo levadas simplesmente à prática religiosa. Usar sal grosso para
espantar mau-olhado, colocar um copo de água sobre a televisão para
receber cura, utilizar um ramo de arruda para espantar maus fluídos, dar
dinheiro para receber bênçãos, entre outros, é estar subordinado à
fé-na-fé, é praticar religião. Isso não tem nada a ver com o Evangelho
ou com os princípios de fé, conforme expressados nas Sagradas
Escrituras.
Quando
usamos a palavra fé estamos tratando de uma reação de confiança a
determinado conjunto de fatores. No caso da fé em Deus, ela não se
inicia com o ser humano, como diz a religião. Antes, inicia-se quando
Deus se revela a nós, quando Ele abre o Seu coração para conosco e
revela o Seu amor e Sua graça concretizados em Jesus Cristo. Assim, a fé
começa com o caráter de Deus e a obra que Ele realizou por nós através
de Seu Filho.
A
Bíblia apresenta a seguinte definição de fé: “A fé é a certeza de
coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem” (Hb 11.1). A
fé é uma certeza que vem da revelação da Palavra de Deus, é um canal de
confiança viva, é “a certeza” que se estende do homem até Deus em
confiança no que o próprio Deus falou. A palavra certeza significa “uma
percepção mental segura” e refere-se à convicção de que as promessas de
Deus nunca falham. Ter fé significa “acreditar no testemunho de outrem”.
Assim, a verdadeira fé envolve inteiramente a confiança no testemunho
da Palavra de Deus.
A
revelação vem da Palavra de Deus, e a verdadeira fé começa com a
revelação e por ela é fundamentada. Após a revelação, vem a compreensão
dessa revelação. Quando a revelação é recebida e compreendida, obtém-se
então o conhecimento. Quando se adiciona a confiança a esse
conhecimento, a fé pode ser demonstrada. Essa é a ordem das coisas. A
manifestação de qualquer coisa proveniente de Deus é por fé somente,
porque Deus estabeleceu esta lei da fé: “O justo viverá pela fé” (Gl
3.11). Não podemos mudar esse conceito, pois a nossa vida será sempre
decorrente do que cremos.
Podemos
viver um sólido tipo de fé inteiramente baseada numa correta
interpretação das Escrituras, quando a verdade se credencia na prática,
ou viver uma fé aprisionante originada de conceitos advindos meramente
da religiosidade humana.
Em
suma, quando confiamos na Palavra de Deus e agimos de acordo com a
mesma, obtemos o que Deus diz que teremos ao confiarmos Nele. O Deus
verdadeiro é quem garante a Sua Palavra.
Quando,
porém, seguimos regras humanas e religiosas, colhemos somente a
decepção de não sermos suficientes para as exigências que o carcereiro
chamado fé-na-fé nos impõe. Pois fé-na-fé só conhece cobrança e
exigência, não garante nenhuma liberdade, e ainda mais, nos aprisiona em
regulamentos e nos torna reféns do nosso próprio infortúnio.
Crer em Deus e em Sua Palavra produz liberdade. Seja livre!
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